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Qual o futuro da indústria moçambicana?

O sector industrial em Moçambique é ainda pequeno e de baixa tecnologia, excluindo obviamente a indústria de extracção e alguns megaprojectos. A contribuição por parte da indústria, agricultura e serviços em termos de PIB não mudou significativamente nos últimos dez a doze anos, nem houve, tão pouco, um aumento significativo na percentagem de postos de trabalho criados com o sector da indústria.

De forma a contrariar esta tendência já verificada, a Estratégia Nacional de Desenvolvimento (ENDE) colocou este sector no centro dos planos de desenvolvimento futuro de Moçambique. A indústria transformadora é importante pelas suas potenciais contribuições para a mudança estrutural da economia, pela diversificação, pela geração de empregos, atração de investimento estrangeiro, transferência de tecnologia e aumento da produtividade.

Observando o que se passou noutros países, constata-se que os booms de recursos naturais têm como consequência o excessivo aumento da procura de moeda local, empurrando os preços de bens e serviços para valores superiores aos habituais. Como consequência verifica-se uma valorização da moeda e um aumento dos preços relativos ao trabalho, imobiliário, construção civil, transportes e logística, tornando-os mais caros. Por sua vez, esta alteração de preços afecta negativamente a produção. Este efeito é conhecido por “doença holandesa” e  pode resultar numa virtual eliminação do sector industrial.

Um estudo recente encomendado pela CTA e SPEED incide sobre o estado actual da indústria em Moçambique e visa prever o que pode acontecer num cenário de “doença holandesa”. O relatório observa que as empresas deste sector enfrentam uma série de obstáculos na sua tentativa de fazer negócios em Moçambique. São poucas as que podem e tentam exportar. Deparam-se com incertezas quanto à disponibilidade e qualidade da energia eléctrica, taxas de licenciamento, custos de transporte, procedimentos de importação e exportação, um salário mínimo desenquadrado com a produtividade e outras questões relacionadas com o ambiente de negócios, que acabam afectando todo o sector da indústria. Se hoje em dia este sector já não é competitivo, imagine-se a redução que sofreria num cenário de “doença holandesa”.

É verdade que algumas empresas operam em segmentos de mercado que lhes proporcionam alguma resistência à “doença holandesa”. Por exemplo, as empresas de capital intensivo que compram a maior parte das matérias primas no mercado internacional e produzem bens de consumo para o mercado interno, podem conseguir reduzir os seus custos, o que lhes permite manter ou aumentar as suas quotas de mercado, mesmo face a importações mais baratas.

No entanto, esta não é a perspectiva para a maioria das empresas. Para empresas que produzem produtos poucos diferenciados para o mercado interno, as importações mais baratas certamente iriam “exterminá-las”. Algumas dessas empresas, actualmente, reforçam a sua competitividade ao oferecer aos consumidores serviços de valor acrescentado e isso pode ajudá-las a competir a curto e médio prazo.

Para as empresas que produzem bens pouco diferenciados e facilmente substituíveis, que exportam produtos processados com base em matérias primas importadas, ou que exportam produtos bastante padronizados para o exterior, a perspectiva de um boom de recursos naturais traduzir-se-ía num péssimo cenário. Os produtos substitutos importados facilmente exterminarão os bens produzidos localmente.

As empresas que baseiam a sua produção no trabalho intensivo ou na produção de produtos de valor acrescentado e bens padronizados, verão os seus produtos ficarem mais caros quando comparados com dólares norte-americanos, em virtude da subida do metical. Essas empresas já estão sob pressão. São raros os exemplos de indústria de trabalho intensivo e orientada para a exportação em Moçambique.

Em resumo, a “doença holandesa” tornará as coisas ainda mais difíceis para a maioria das empresas no sector industrial em Moçambique.

Essa possibilidade vai, muito provavelmente, frustrar os objectivos da política de industralização do Governo. Deve-se por isso começar, desde já, a fazer uma cuidadosa gestão macroeconómica e procurar fazer investimentos estratégicos para melhorar a produtividade e o ambiente de negócios. Caso contrário, Moçambique pode acabar por ficar apenas com algumas empresas industriais no sector não-extractivo, em vez de concretizar o plano expresso na ENDE para uma completa industrialização.

As empresas de capital intensivo, que criam poucos postos de trabalho e que importam matéria prima do estrangeiro, são as que têm perspectivas mais favoráveis num cenário de possível “doença holandesa”.

O tipo de empresa mais importante num processo de industrialização, é aquela que se baseia em trabalho intensivo, adquire matérias primas localmente e que exporta uma boa parte dos seus produtos. No entanto, este é o tipo de empresas que actualmente enfrentam dificuldades significativas e que estão mais propensas a sofrer um cenário de “doença holandesa”.

De forma a aumentar as possibilidades de sucesso do sector industrial moçambicano, assim como do seu plano de industrialização, é importante atenuar o impacto da “doença holandesa” e melhorar o ambiente de negócios em geral, prestando atenção à competitividade do salário mínimo, aos estrangulamentos e ineficiências de infraestruturas, e ainda, fazer investimentos estratégicos para melhorar a produtividade em sectores tradicionais da economia.

Se essas medidas não forem tomadas antecipadamente, e sob um cenário de “doença holandesa”, as consequências a longo prazo para a transformação estrutural da economia serão, extremamente pessimistas. Os benefícios a longo prazo do processo de industrialização e, portanto, a transformação estrutural, só podem ser realizados se, quem detem o poder para tomar decisões, gastar de forma sábia os lucros obtidos com os recursos naturais nos próximos anos, afim de estimular a economia para que funcione de forma mais eficiente e produtiva para as gerações vindouras.